terça-feira, 7 de junho de 2011

Reflexões de aniversário

Aniversários são datas realmente muito interessantes, cheias de pessoas alegres, dias belos (mesmo com chuva e frio), presentes, festas e amigos. A data que representa nossa chegada a este lindo mundo cheio de surpresas agradáveis. Uma data que nos leva aos dias da infância, quando criança, os aniversários são tudo que esperamos depois do Natal e do Ano Novo, pois sempre esperamos a grande festa do nosso aniversário, e quando ganhamos, vamos aos céus por algumas horas.


No entanto ao que parece ninguém em todo Ocidente parece visualizar o outro lado dos aniversários e suas conseqüências. Fico me perguntando os porquês de as pessoas neste mundinho ocidental gostarem tanto dessa data?

Iniciando pelo nascimento, não preciso nem dizer muito, já nascemos chorando e berrando aos quatro ventos nossa indignação por ser obrigados a deixar o ventre materno e o “lado de lá” e viver por aqui. No Oriente, a data do nascimento das pessoas é um dia de pranto.

Até os quatro anos nós não temos idéia do motivo da festa, em alguns casos o efeito da festa é muito susto e medo para a criança e dor de cabeça para a mãe. E nos anos seguintes nas festas de aniversário a única pessoa não feliz é a nossa mãe. Despenteada, arrancando os cabelos, cansada, irritada... quase aos prantos, enquanto todo mundo desfruta da festa. E no fim, os convidados todos, sem exceção, e em especial a sogra e a cunhada maléfica, vão embora com vários defeitos e contratempos da festa a contar pra todo mundo que conhecem, como doces quentes ou insuficientes (como se doces em algum ponto da história humana tenha sido suficiente para alguém), salgados frios, bolos enjoativos, decoração horrível, banheiro sujo e disputadíssimo e bebidas quentes. Nós, felizes aniversariantes, dormimos felizes e empanturrados, e nossas mães desmaiam em qualquer canto que restou limpo, pronta para os próximos dias de continuação da terrível festa.

Dias, semanas e meses seguintes nossas mães nos fazem pagar por cada stress, qualquer coisa, qualquer motivo será motivo para um castigo, um berro ou safanão acompanhados de todo um discurso sobre o sacrifício dela e dos gastos incalculáveis daquela festa.

E depois que crescemos? Você, caro leitor, acha que melhora? Lógico que não.

Datas de aniversário são motivos de muitos sorrisos amarelos, desejos de boas novas, abraços distantes, ações hipócritas e “amigos” que não vemos a anos a nos enviar os insólitos cartões, e-mails e posts de Parabéns. Grandes presentes para iniciar bem um dia que marca mais um ano de vida, um passo a mais em direção de nosso grande espetáculo, o fim da juventude e início da velhice (se tiver a sorte de viver tanto) e no fim, a morte.

Aniversários tem amigos e família, felizmente. Eles são nossos bálsamos diante da aspereza da vida e do cotidiano. No entanto, nenhum jardim que se preze só tem flores. Os anti-amigos são necessários em nossas vidas, e é justamente nos aniversários que eles surgem com todos os seus defeitos mais repugnantes, para nós, e se aproximam de nós para os tradicionais abraços, apertos de mão e desejos de boas novas e felizes aniversários vindouros, muito embora tenhamos a certeza absoluta que eles desejam ardentemente que caiamos de uma escada qualquer e quebremos as duas pernas e, pelo menos, três costelas. Dos chefes, nem é preciso falar muito, basta dizer que fazem parte de uma categoria social que está aí para serem os inimigos nº 1 de todo funcionário. Não há chefe bom, só chefes que desejam parecer melhores para tentarem atingir mais os funcionários.

Assim, terminando logo este texto e tentar ser mais sucinto possível e, assim, ser lido por todos – o que é muito difícil, eu sei, afinal de contas textos com mais de dois parágrafos curtos já é longo e chato demais para a maioria – peço a todos que considerem as minhas palavras e façam o sincero favor de esquecer a data de meu nascimento e esqueçam comigo que eu faço aniversários. O dia e o ano que nasci só são interessantes para os médicos, meu banco, minha seguradora e para o INSS. Que tal comemorar datas mais importantes, sejam elas quais forem, menos os aniversários?


(Texto postado no mural do meu trabalho, de forma a observar a reação das pessoas e levar a algumas discussões pertinentes à naturalização das festividades)

domingo, 27 de março de 2011

FALANDO SÉRIO: LIÇÕES SOBRE AS DIFERENÇAS ENTRE O FALAR E O ESCREVER

Alexandro Venâncio da Costa Lopes[1]
Quando entramos no mérito da questão do “falar errado” entramos também em um campo minado pleno de perigos visíveis, mas que nos surgem como inofensivos, e outros ocultos profundamente incrustados nos conceitos ideológicos mais “naturais” dos indivíduos. Quando tentamos discutir a Língua em seu aspecto sociológico nossa abordagem não deve se fechar em aspectos estéticos, dogmáticos e, principalmente, gramáticos. Quando fechamos nossa visão nestes aspectos temos a ilusão que a Língua Portuguesa está morrendo nas bocas de pessoas sem educação e vergonha na face, e isto é um erro grosseiro, é discriminador e exclusivo.

Em primeiro lugar, existe uma grande diferença entre o “falar bem” e o “falar correto”. O “Falar Bem” se refere a todo o conjunto da Retórica, técnicas de Oratória, construção do discurso, entonação da voz e cuidado com as palavras a serem pronunciadas. Este conceito não tem ligação alguma com o “Falar Correto”, que se refere a um dialeto socialmente privilegiado e repleto de sentidos discursivos exclusivos e marginalizadores. Uma pessoa do campo pode “falar bem” com toda a propriedade de um ótimo advogado, usando seu dialeto compreensível aos seus iguais, enquanto um médico de uma grande cidade pode “falar errado” em seus momentos de descontração com a família. No entanto, tais diferenças estarão melhor definidas mais adiante.

Em segundo lugar, a linguagem oral não é a mesma coisa da linguagem escrita. Embora a segunda seja produto da primeira, nossa cultura educacional, ainda estruturada segundo os moldes da educação tradicionalista, acaba nos ensinando dois grandes erros, o primeiro que as duas formas linguísticas são a mesma coisa chegando ao ponto de confundir letras com sons. O segundo, que falar bem é falar como se escreve.

Como já dizia minha eterna professora de Linguística, em sua bela construção poética e didática, a Língua Falada é como o grande rio Amazonas enquanto a Língua Escrita, um pequeno igarapé. A Língua Falada obedece a regras e convenções próprias, ela reflete o grupo social que a utiliza, e, portanto, ela é cultural. A Língua Falada muda, sim isso mesmo, ela muda, ela se transforma, nela palavras caem em desuso e novas palavras construídas ou importadas de outras línguas, e, portanto, ela é histórica. A Língua Falada, por representar grupos acaba se tornando uma marca, um estigma para grupos socialmente excluídos e marginalizados, e assim, ela é social e política. A Língua Falada é viva, avassaladora e dinâmica, e não precisa ser salva.

Agora a Língua Escrita, em seu igarapé repleto de juncos e vitórias-régias não possui o mesmo ritmo. Ela é uma representação gráfica da Língua Falada de um determinado período, onde um determinado grupo social convenciona seu uso, e com o passar do tempo vão ajustando o que é necessário para torná-la mais uniforme para todos os grupos falantes da mesma Língua. O ritmo de mudanças é lento, as águas deste braço do grande rio são extremamente calmas, mas em determinadas épocas o grande rio, em épocas de cheia, traz novas águas e transforma a Língua Escrita. Caso deseje um teste empírico simples, procure um livro, qualquer obra, mas sugiro Machado de Assis, da década de 1950, 1960 ou até mesmo, 1970 e compare as estruturas linguísticas e as palavras usadas com os mesmos livros vendidos hoje. É nesse igarapé que os especialistas do “bem escrever e do bem falar”, das gramáticas normativas e alguns outros que tentam “salvar a Língua” se banham e matam a sua sede, e alguns gostam tanto desta calmaria, constroem moradias em suas margens e acabam esquecendo que a Língua verdadeira está logo mais, viva, dinâmica e pronta para mais um processo de enchentes.

A partir destes parâmetros para discussão podemos entrar nos ramos da Sociolinguística, da Semiótica e da Análise do Discurso. Embora outras áreas da Educação, Psicologia Social, Antropologia, Sociologia, Ciência Política, e até mesmo da própria Linguística tenham muito a dizer sobre o assunto, e poderíamos bem elencar todos, este texto ficaria muito extenso e creio que não atingiria o objetivo neste momento. A partir deles, vou discutir um pouco sobre a Língua Portuguesa falada, suas funções e representações sociais, e não pretenderei me deter na Língua Escrita, pois esta já é normatizada e representada por diversas instituições, como a Escola, Academia, ABNT e poderes estatais brasileiros e internacionais de línguas lusófanas.

Para exemplificar a discussão, podemos trazer a seguinte frase: QUEM DIZ QUE É DO MATO GROSSO NÃO É DE MATO GROSSO[2]
 
Para os normativos de plantão, tal frase está corretíssima e passível de reprodução fiel e cheia de explicações, também normativas e sintáticas, uma vez que a partícula DO é um termo possessivo formado por DE + O e que transmitiria a idéia de o indivíduo ser oriundo de um mato qualquer, sendo o correto então utilizar apenas o termo DE, que se refere à origem. Gramaticalmente e estilisticamente tal explicação é válida, uma vez que não podemos saber quem irá ser o texto, não conhecemos anteriormente sua bagagem social, cognitiva e histórica, nosso texto deve ser claro e objetivo. E, a menos que seja esta a intenção, não podemos deixar nosso leitor na dúvida se estamos falando de um matagal ou do Estado de Mato Grosso.

Contudo, para a semiótica, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de produção de significação e de sentido, tal frase dita por um falante brasileiro da língua portuguesa está correta, já que para todos os brasileiros é de notório conhecimento sobre a existência de um Estado de Mato Grosso, que fica na região central do país, então na formulação da frase o falante não sente a necessidade de emitir a frase completa: EU SOU DO ESTADO DE MATO GROSSO, e economiza na saliva e no fôlego e diz somente: SOU DO MATO GROSSO, e é compreendido pelo seu ouvinte, caso não seja, há possibilidade de explicações.

Já para a Sociolinguísta ou para a Análise do discurso a frase é equivocada e carregada de significados históricos e ideológicos. Ao introduzir o verbo DIZ na frase sinaliza-se uma marca de oralidade, estamos estabelecendo uma regra normativa para a Língua Falada. Introduz-se aí o discurso integralista do período ditatorial de modos de “falar correto”, que acabou por se tornar um processo de marginalização, exclusão e anulação da identidade dos grupos sociais que não falavam deste modo, tais como os nordestinos, “caipiras” mineiros, goianos e paulistas, os grupos das periferias, entre tantos outros.

É preciso entender que a Língua Portuguesa não é uma entidade astral única que nos concede o dom da fala, e, deste modo, deveríamos respeitá-la e falar da mesma forma. Língua Portuguesa é o nome dado a todo um conjunto de dialetos e variantes lingüísticas que podem manter comunicação entre si, por exemplo, um nordestino consegue conversar com um paranaense ou gaúcho normalmente; nós brasileiros podemos conversar com portugueses ou angolanos sem grandes obstáculos na compreensão. A este fenômeno dialógico dá-se o nome de Língua, nós possuímos estruturas lingüísticas semelhantes que possibilitam a comunicação, e assim, todo modo de “falar” é correto e representativo. Caso desejem saber mais sobre tudo isso, busquem a leitura dos livros Preconceito Linguistico: o que é, como se faz e A Língua de Eulália, ambos de Marcos Bagno.

Nas obras o autor vem delimitando os espaços de análise da sociolingüística e desvelando este preconceito sutil com relação às pessoas que “falam errado”, que por sinal seriam os nordestinos, indivíduos provenientes do meio rural ou das periferias das cidades, negros quilombolas, analfabetos, jovens, entre outros grupos. Para ele o preconceito linguístico não se deve ao uso da Língua em si, mas sim à representação social do indivíduo, discriminar um indivíduo que diz “nóis vai”, por exemplo, é discriminar sua história social oriunda de setores agrários de um Brasil latifundiário e atrasado, ao dizer que seu falar é errado não é se referir discriminativamente apenas à sua variante linguística, mas sim rejeitar sua classe social e a história de sua identidade cultural.

Tal discurso de “limpeza lingüística” teve grande validade durante os períodos de Ditadura no Brasil, uma vez que, enquanto estratégia política, nestes períodos buscou-se realizar o ideal de Nacionalismo e integração das diversas regiões do país, e para isso deveria ser criada uma Cultura Nacional que sobressaísse às diferenças regionais e grupais, e como desde os tempos da Roma Antiga já sabemos que para dominar qualquer povo é preciso impor-lhe a língua do dominador em detrimento de sua própria língua. Assim, em prol da Língua Portuguesa Nacional que deveria ser a mesma para toda e qualquer parte do país, seguindo a mesma estrutura e pronúncias, que seguiria os moldes da variante falada pelos detentores do poder, toda variação desta seria considerada “errada”. Discurso comprado e difundido pela Educação, em todos os níveis.

Resultado: Conseguiram. Até os nossos dias, vinte e cinco anos depois do fim da Ditadura ainda temos, entre os falantes da Língua Portuguesa, a consciência de que falamos uma língua extremamente difícil, e ainda não a falamos “corretamente”. Rejeitamos nossa identidade regional e histórica, temos vergonha dos nossos familiares e entes queridos que exercem seu direito de usar seus dialetos. E o pior, discriminamos, rejeitamos e desqualificamos hipocritamente as pessoas utilizando seu modo de falar e em prol de uma Educação Linguística esmerada, mascarando nossos reais preconceitos. Ainda continuamos a rejeitar as diferenças idiossincráticas dos cidadãos brasileiros, como se não tivéssemos o direito igualitário de sermos diferentes dos demais, continuamos a excluir grupos sociais legítimos e possuidores de culturas únicas e socialmente importantes por não desejar sua inclusão política. Até quando continuaremos de olhos vendados para a realidade que está do lado de fora do nosso mundinho fechado?

Concluindo, deixo muito bem claro que minha posição é em prol das identidades culturais e do direito constitucional de igualdade e de livre expressão. Se em estou entre minha gente, vou falar meu dialeto “mineirês” sim. Mas também tenho plena convicção que, como já evidenciou Bourdieu, enquanto ente social, devo compreender que é preciso adquirir capital social e cultural de todas as formas possíveis para melhor empreender estratégias sociais mais eficazes. Falar o dialeto culto, também chamada de “norma culta ou padrão”, faz toda diferença em determinadas situações e ambientes, é preciso aprender a viver socialmente e saber administrar nossas estratégias políticas do dia-a-dia. É preciso entender e ensinar o respeito às diferenças, toda e qualquer uma, e assim o professor de Língua Portuguesa nas escolas não deve ser apenas um ditador de regras normativas a serem aplicadas em análises sintáticas desconexas de realidade, deve ensinar sim a variante “culta”, deve ensinar sim a escrever bem, e, também, ele deve ser um pouco de sociólogo mostrando as diferenças entre os falares de cada cultura e de cada grupo, a “norma culta” e onde é possível usar cada uma, e assim ajudar a entender os motivos das grandes diferenças, por exemplo, de um político que fala a língua que seu povo entende, como faz o ex-presidente Lula, e de um advogado diante de um tribunal defendendo seu cliente.




INDICAÇÕES DE LEITURA

BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico: o que é, como se faz. Edições Loyola.

____________. A Língua de Eulália: novela sociolingüística. Editora Contexto.

FOUCALT, Michel. Isto não é um Cachimbo. Editora Paz e Terra.

____________. Vigiar e Punir. Editora Vozes.

McCLEARY, Leland. Sociolinguística. Disponível em: http://ecs.futuro.usp.br/docs/Sociolinguistica.pdf

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. Editora Perspectiva.

Semiótica: Perguntas e respostas. Disponível em: http://www.pucsp.br/pos/cos/cepe/semiotica/semiotica.htm

 


[1] Alexandro V. da Costa Lopes é Licenciado em Língua Portuguesa e Inglesa e respectivas Literaturas pela Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT, Graduando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Estado de Mato Grosso – UFMT e Pós-graduando Latu Sensu em Gestão Estratégica do Setor Público pelo Instituto Cuiabano de Educação – ICE.

[2] Uma frase tão bela e didática quanto “Ivo viu a uva”... (também sou humano, oras pois...)

domingo, 17 de janeiro de 2010

Haiti e o BBB10 no dia a dia

Neste fabuloso domingão de férias com a vida inteira de coisas interessantes para se fazer, mas como milhões de brasileiros, sem saco nenhum para fazer nenhuma destas coisas importantes para o corpo e intelecto, resolvi assistir a programação da fabulosa e necessária Rede Globo de Televisão.

E depois de assistir um Fantástico dedicado ao Haiti e seu desastroso terremoto, assunto este que assumiu a liderança de qualquer rede de televisão. Não tenho nada contra explorar o assunto como se não houvesse nenhum outro assunto importante no Mundo inteiro, ou mesmo na casa do vizinho. Afinal de contas foi um desastre que abalou um país inteiro, sem falar dos cidadãos de todo o mundo que lá visitavam ou trabalhavam, e ainda levou para sempre nossa mui querida Zilda Arms.

Entre uma notícia e outra do Haiti, salvamento e mortes, vem uma reportagem sobre os lixos que cada cidadão brasileiro joga no meio das vias urbanas das cidades sem pudor algum... Sinceramente, a falta de vergonha do brasileiro já tão desenvolvido pela mídia nacional e internacional e pela política do país associado ao individualismo extremo que leva a cada um acreditar que é o rei/rainha das ruas sem levar em conta ninguém mais explicaria esse comportamento cultural brasileiro, entre tantos outros tipos de comportamento. Em miúdos, PURA FALTA DE VERGONHA E CONSIDERAÇÃO AO PRÓXIMO, mas sem levar isso à generalização, pois pouquíssimas pessoas no país não agem assim...

Além de outra reportagem destaque do programa, vergonhoso também, as garotas que entre um suco de laranja vendido e outro levavam os caminhoneiros da região noroeste paulista para uma barraquinha especial de lona onde vendiam outras coisas de igual importância... Seus lindos corpinhos devidamente expostos.

Em suma, um programa especialmente produzido para nos levar a uma certa tristeza e pesar pelas mazelas do mundo, fazer-nos sentir vergonha pelas ações fúteis de “alguns” brasileiros diante de toda a problemática de um país inteiro arrasado por um fenômeno natural, sofrendo com vitimas soterradas, mortos por todo canto, pessoas desabrigadas passando fome e sede e, ainda por cima, servindo de figurantes gratuitamente para toda a mídia do mundo.

Depressão é a ordem do Fantástico no dia de hoje. Lastime pelo mundo. Chore pela grande Zilda, matriarca da Pastoral da Criança. Fique de Luto.

Mas logo depois de tudo isso, ainda com os olhos mareados de lágrimas, ainda sob a ordem de luto, vem o programa a seguir: BBB10, e de cara FESTA. Alegria, Risos, gente bonita (entre histeria coletiva e comas alcoólicos), a Globo nos dá novas ordens comportamentais completamente diferentes em menos de 30 segundos.

A influência da mídia na cultura e no comportamento é algo que nem é preciso discutir, já se foi observado, relatado, cientificado já faz algum tempo, e eu mesmo sempre reflito muito sobre isso. Aí, lanço-me uma nova pergunta, como pode uma sociedade conviver saudavelmente com tal discrepância áudio-visual na sua vida?

Como podemos desenvolver a exigência de um real sentimento de pesar, de auteridade, ou mesmo de luto se no momento seguinte nos é cobrado alegria constante, disposição para festejar até o amanhecer e beber litros e litros de qualquer coisa que tenha graduação alcoólica acima de 10% e ainda por cima ser uma miss e um mister universo na beleza e na saúde. E o pior de tudo isso, é pensar que as pessoas tentam conviver com toda esta carga de exigências sem ao menos percebê-las quanto mais refletir tudo isso.

Como podemos criar uma nacionalidade, um sentimento de pertença a uma nação se a regra é se isolar para ver pessoas isoladas do mundo pensando apenas no seu mundinho particular, contra tudo e todos ao seu redor, desenvolvendo uma paranóia coletiva.

A mídia é cruel, mas não sem noção ou reflexão sobre sua função social, sua importância na vida das pessoas, no seio de seu lar como em sociedade. Ela sabe muito bem o que faz, mas e NÓS... será que sabemos lidar com isso? Creio que não.

Ainda vou refletir tudo isso melhor... quem sabe sai a continuação deste texto outro dia...

sábado, 9 de janeiro de 2010

Comportamentos não tem origem biológica mas sim na interação social, segundo estudo.

Neandertais criaram joias sem ajuda de humanos
RICARDO BONALUME NETO da Folha de S.Paulo

Joias e cosméticos podem parecer fúteis para algumas pessoas, mas uma descoberta anunciada ontem --a de que neandertais já eram capazes de produzir esses adereços 50 mil anos atrás-- significa que hominídeos pré-históricos já tinham pensamento simbólico.

Achados na Espanha, os artefatos indicam, que mesmo não sendo ainda "anatomicamente moderno", o tão desprezado neandertal já era, inequivocamente, dotado de "modernidade comportamental", segundo os autores do estudo, liderado pelo arqueólogo português João Zilhão, da Universidade de Bristol, Reino Unido.

As "joias" eram basicamente conchas marinhas furadas para uso em colares. Algumas delas tinham também pigmentos coloridos, principalmente amarelo e vermelho, que poderiam ser usados como cosméticos.

Não são os primeiros adereços que são vinculados a neandertais; mas as descobertas anteriores eram controversas por vários motivos. Há quem argumenta que a vinculação em determinados sítios seria resultado de mistura de material de camadas diferentes do solo.

O argumento mais ofensivo aos neandertais era que eles teriam "copiado" as joias dos seres humanos anatomicamente modernos que saíram da África, durante um período de convivência que se deu na Europa de 40 mil a 30 mil anos atrás.

Mas os novos achados, artefatos de até 50 mil anos, derrubam essa hipótese. O estudo, assinado por Zilhão e outros 17 cientistas, está publicado na revista científica "PNAS".

Os dois sítios arqueológicos onde foi feita a descoberta ficam em Cueva de los Aviones e Cueva Antón, na Murcia. Em Aviones, uma caverna que na época da ocupação humana distava até 1,7 km do mar, foram achadas conchas de moluscos perfuradas ao lado de restos de corantes amarelo e vermelho.

Já em Antón, um abrigo de pedra a 60 km da costa, foi achada uma concha perfurada pintada em seu lado externo de branco com cor de laranja.

Zilhão conclui que as descobertas são evidência contra a ideia de que os genes dos hominídeos determinavam seu comportamento: o que importava eram as interações sociais.


Reportagem da Folha on line, caderno Ciência e Saúde, de 09/01/2010 às 11h26. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u676882.shtml

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

vídeo de apresentação do COP15

http://www.youtube.com/watch?v=xDaRRqd4E5E

MST NOSSO DE CADA DIA

Por: Alexandro V. da Costa Lopes



Mais uma vez o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi parar nos meios de comunicação de massa, desta vez com a ocupação da fazenda do grupo Cutrale em Borebi – SP, a 311 km da capital, onde ocorreu a derrubada dos pés de laranja, entre outras coisas. Fato este que trouxe repercutiu em outro assunto que poderá ser assunto de vários dias para a mídia caso tudo ocorra como os parlamentares desejam, conforme Miranda (2009) a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) movida pela bancada ruralista do Senado e poderá ser efetivada no dia 09 de dezembro em local a ser definido.

CPMI esta que se propõe a investigar e avaliar os repasses pelo governo através de ONGs ao MST, bem como recursos de fundações e instituições internacionais que irrigam e dão condições à organização do movimento.

Tudo isto muito bem amparado pela mídia em geral, em especial os meios tradicionalmente baseados na formação de opinião da grande massa como as TVs Globo, SBT e Record, revista Veja, principais sites de notícias, manejando os fatos de forma primorosa em favor de um dos lados da moeda, e este não representa nenhum movimentos sociais ou qualquer comprometimento com a sociedade em geral.

Em resumo, o MST passa por um período crítico em sua história de atuação no campo em busca de uma reforma agrária justa em prol da agricultura familiar, uma vez que o processo de tratar o movimento como um ente criminoso, iniciado há alguns anos começa a ser legitimado na sociedade civil (cada vez mais “afogada” nos ideais neoliberais), e hoje o Estado inicia o processo judicial para relegá-lo à exclusão total.

Contudo, cabe a nós repensar este processo histórico brasileiro de embates e disputas entre os grandes proprietários de terras e aqueles que pouco ou nada possuem, e que não é um processo novo e iniciado pelo MST. Muito pelo contrário. Vem deste o “Descobrimento” do país e a apropriação do Rei de Portugal de todo o território brasileiro de então, ignorando todas as populações indígenas e seu uso das terras. Bem como o nosso problema agrário tampouco é um problema somente nosso, mas de todas as nações, e herdamos nossa parcela da Europa Medieval e lhes demos os matizes que podemos observar ainda hoje, por exemplo, o modelo agrário medieval, que seguimos por vezes rigorosamente, onde os grandes senhores eram proprietários de grandes extensões de terras, exercendo poder supremo nelas.

Não que este modelo não gerasse conflitos de igual ou superior poder. Conflitos estes que na Europa levou à formação do Estado supremo, à Revolução Burguesa, e consequentemente à evolução do capitalismo.

Aqui no Brasil também gerou conflitos importantes, mas como temos uma forte cultura paternalista, de não afrontamento, de estagnação social e um célebre esquecimento político, o modelo medieval de propriedade sobreviveu, em especial no meio rural. Além disso, nossa História, enquanto arte daqueles que vencem, fez sua parte menosprezando ou relegando ao esquecimento aqueles que não pertenciam ao rol dos “escolhidos”. Como exemplo destes conflitos podemos destacar as fugas dos escravos negros e indígenas que geraram os inúmeros quilombos espalhados pelo Brasil afora, as lutas homéricas de Zumbi dos Palmares, Canudos no sertão baiano e sua sociedade alternativa, e a conseqüente guerra que resultou entre 15 a 20 mil mortos, ou ainda, num passado mais recente, Carajás e outros conflitos de latifundiários e MST.

Sem muito refletir podemos verificar que há um conflito no que se refere à propriedade no Brasil, que nunca teve como princípio servir a todos, de modo que a propriedade ao invés de ter um papel de coesão social, e tem o papel de diferenciação social, entre os possuidores, que são efetivamente cidadãos, e aqueles que não a possuem, e consequentemente não são cidadãos. Resultando assim na luta entre a elite formada pelos grandes proprietários que desejam “proteger” sua propriedade e os movimentos sociais que desejam a justiça social, onde cada qual arma-se dos melhores meios possíveis. Onde o Estado comunga com os interesses das elites e usa a máquina estatal para protegê-los, enquanto os movimentos sociais buscam o poder da legitimidade do povo e a mobilização de grandes massas em prol de seus ideais, forçando o Estado a aceitá-los.

Entre os principais movimentos sociais modernos lembremo-nos dos sindicatos e suas lutas em prol dos direitos dos trabalhadores, das greves e conflitos. Lutas que forçaram o Estado e as elites a reconhecê-los e a cederem espaço no dialogo, o que resultou nos direitos trabalhistas atuais.

Mas por que o MST, em sua luta pela reforma agrária, provoca tal poder de impacto que nenhum outro movimento social moderno foi capaz de promover? Por que o governo desqualifica suas ações constantemente e dificultam as negociações?

Primeiro, porque a reforma agrária nunca foi efetivada no Brasil. Foram realizadas somente algumas medidas paliativas foram estabelecidas pelo Estado, visando a solução imediata dos conflitos sociais, mas nunca uma reestruturação do sistema agrário brasileiro, entre estas medidas foi a colonização das regiões Centro-Oeste e Norte entre as décadas de 1960 a 1980, incentivadas pelo poder público e realizadas por iniciativas privadas. Aliviando, assim, as tensões agrárias no período.

Além disso, o MST arma-se contra o princípio tradicionalmente mais protegido no Capitalismo, a propriedade privada. O MST luta pela reforma agrária, ou seja, que a propriedade tenha uma utilidade real e social. Neste sentido é um movimento revolucionário, pois mexe com a base estrutural do sistema, podendo abalar a sociedade e os princípios já estabelecidos, assim como os sindicatos de trabalhadores das cidades em seu período de abrangência social, que buscavam por benefícios sociais negados pelo Estado e pela elite econômica, embora estes nunca tenham questionado os direitos e deveres da propriedade privada.

Do outro lado, a elite luta pelo direito de fazer o que bem entender com sua propriedade, inclusive deixá-la lá, quietinha, não produzindo nada, somente esperando ser valorizada, ou produzindo produtos de exportação em larga escala. Baseiam-se no ideal neoliberal do direito fundamental e inalienável à propriedade, uma vez que esta é resultado do uso racional do trabalho, da economia e do sacrifício individual, e, portanto, cada um tem o direito de fazer dela o que quiser, pois o direito à propriedade (e sua manutenção) é um direito que é superior ao interesse público. Sendo que o Estado tem por função proteger estes direitos, mesmo que para isso seja necessário o uso do poder de polícia, como deixou bem claro Maílson da Nóbrega em seu artigo na Revista Veja.

Opinião esta partilhada por boa parte dos representantes políticos que estão no poder, ou seja, uma proposta de sociedade praticamente consensual, iniciada no governo de Fernando Henrique Cardoso e que ganha mais força a cada dia pela legitimação social, manipulada pela mídia. De maneira a garantir no seio da sociedade a constatação que o MST é um movimento que pouco se importa com a questão agrária, se preocupando apenas com a subversão do capitalismo, ou seja, da “ordem e do progresso”, que ele deixou as questões reais para se envolver em política, associando o movimento com os ideais comunistas (o que assusta muita gente ainda hoje).

Aliás, a mídia é o mais eficiente instrumento ideológico desta proposta de sociedade, sendo um consenso entre Carvalho Filho (1997), Comparato (2001) e Sigaud (2005) a influência negativa da mídia nos relatos das ações do MST sobre a opinião pública e a sua conseqüente criminalização social ao associar o movimento com “baderna”, invasão de propriedades privadas, destruição de patrimônio, a ações pouco práticas e sem sentido aparente, mas de alta carga política (como a derrubada dos pés de laranja).

Em suma, o movimento social encabeçado pelo MST perde espaço social numa sociedade que já não deseja refletir sobre o papel da propriedade, nem mesmo do que esta significa para cada um de nós, conforme elaborou Comparato (2000) sobre as funções sociais da propriedade e sobre os direitos e deveres vinculados a ela, e que o movimento provoca em cada um de nós ao levantar a questão da reforma agrária. O movimento provoca reflexão sobre nossas bases, e isso dói, isso fere profundamente, por isso a sociedade em geral não quer refletir. O MST deseja movimento, a sociedade prefere ficar em casa e assistir a novela Cama de Gato e sonhar que talvez tenham um dia a sorte da faxineira que vira gente.

Afinal de contas, que sociedade é esta que estamos formando que de tão moderna está perdendo todo e qualquer vinculo social, que já não se preocupa sequer mais com seu vizinho de porta, onde o desejo por novas roupas de marca, carros cada vez mais caros que poucos conseguem sustentar se faz necessidade de primeira categoria, onde programa de final de semana é “passear” no Shopping Center e brincar no telefone de última geração (que é a única coisa faz, pois não liga pra ninguém porque não tem dinheiro para por créditos e nem recebe ligação de outros, pelo mesmo motivo), que programas de TV só querem nos fazer comprar coisas que não precisamos e que não temos dinheiro para comprar, que falemos como não jamais falamos, que pensemos exatamente como eles pensam, que vejamos as brigas familiares e a desestruturação social como algo engraçado e normal, que vejamos o mundo como algo impassível de mudança e que tudo é “natural”.

No fim das contas, somos cada vez mais exatamente aqueles que “eles” querem que sejamos e que aceitemos tudo como está como algo imutável. Somos cada vez mais filhos rejeitados pelo grande pai Estado, e para tentar não sermos abandonados obedecer a tudo que nos diz. E no fim, poderemos perder o ultimo remanescente dos movimentos sociais que refletem e enfrentam o capitalismo neoliberal e suas políticas de desapropriação do trabalhador, seja ele rural ou não. Se isso acontecer, somente a revolução que nunca ocorreu no Brasil poderá apaziguar as contradições.







Referências Bibliográficas



CARVALHO FILHO, José Juliano de. Reforma agrária: de eleições a eleições. Estudos Avançados, v. 11, n. 31, São Paulo, p. 99-109, Set./Dez. 1997.


COMPARATO, Bruno Konder. A ação política do MST. São Paulo em Perspectiva, v. 15, n. 04, São Paulo, p. 105-118, Out./Dez. 2001.


COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade. In: STROZAKE, Juvelino José. (Org.). A questão agrária e a justiça. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais. 2000. p. 130-147.


MIRANDA, Paulo Roberto. CPMI do MST poderá ser instalada na próxima quarta-feira. Disponível em:
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